Pesquisa da UFRN identifica nova espécie de pterossauro dentro de vômito fossilizado

O que um vômito fossilizado, guardado por décadas no acervo de um museu, pode nos contar sobre o passado? No caso de um fóssil da coleção do Museu Câmara Cascudo (MCC/UFRN), a resposta foi extraordinária: uma nova espécie de pterossauro, um réptil voador que viveu há 110 milhões de anos.

A descoberta, publicada na prestigiada revista Scientific Reports, do grupo Nature, começou quando o mestrando William Bruno de Souza Almeida, do Setor de Paleontologia do MCC, analisava fósseis de peixes da Bacia do Araripe. Ele notou algo estranho em uma das peças, que estava erroneamente identificada.

Ao levar o material para sua orientadora, a professora Aline Ghilardi, especialista em vestígios fósseis, a surpresa foi dupla: não apenas se tratava de um pterossauro, mas o fóssil estava preservado dentro de um “regurgito” — massa de restos alimentares expelida por um predador, provavelmente um dinossauro.

“Essa descoberta mostra o valor incalculável das coleções de museus”, destaca William Bruno. “O fóssil estava guardado há décadas, e foi a partir de um novo olhar, com novas perguntas e tecnologias, que ele revelou algo extraordinário. Cuidar dessas coleções, estudá-las e mantê-las acessíveis é garantir que o conhecimento continue avançando — porque o futuro da ciência também está guardado nas gavetas dos nossos museus.”

Um “flamingo” de 110 milhões de anos

Batizado de Bakiribu waridza, o nome é uma homenagem direta aos povos Kariri, originários do Araripe. Segundo a professora Aline Ghilardi, a escolha foi feita em conjunto com Idiane Kariri-Xocó, uma guardiã da língua Kariri. Os termos significam “boca” (waridzá) e “pente” (bakiribú), uma alusão direta à anatomia do animal. Idiane destacou que a descoberta representa um “grande marco para o povo Kariri”.

O Bakiribu possuía mandíbulas muito longas e centenas de dentes finos e curvados. Assim como os flamingos modernos, ele usava essa estrutura para filtrar pequenos organismos aquáticos, como crustáceos, da água.

A descoberta é um marco: trata-se do primeiro pterossauro filtrador encontrado no Brasil e o primeiro descrito nos trópicos. Além disso, é a primeira vez na história da paleontologia que uma nova espécie de organismo fóssil é descrita a partir de restos encontrados dentro de um regurgito.

O estudo, coordenado por pesquisadores e pesquisadoras da UFRN, contou com uma equipe multidisciplinar do Museu Câmara Cascudo (MCC/UFRN), Universidade Regional do Cariri (URCA) e USP. 


“Além do valor científico, essa descoberta reforça o papel dos museus regionais e da ciência feita no Nordeste na produção de conhecimento de ponta”, destaca Tito Aureliano.Como parte de uma ação decolonial, o fóssil foi dividido entre o MCC/UFRN e o Museu de Paleontologia Plácido Cidade Nuvens (URCA), garantindo que parte desta descoberta permaneça na região de origem.

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